A Inteligência Artificial está a percorrer o seu caminho de forma galopante em muitas indústrias, embora pareça silenciosa.
Foi em 1997 que o Deep Blue da IBM derrotou o campeão do mundo de xadrez, Gary Kasparov. A partir daí o princípio de vasos comunicantes entre a contribuição humana e tecnológica no desenvolvimento dos produtos e serviços, se tem desequilibrado a favor do último. E este terá de constituir necessariamente um dos grandes temas centrais de discussão no presente e nos próximos anos.
Até que ponto a contribuição humana é prescindível face ao desenvolvimento tecnológico numa determinada actividade? Quando seleccionamos uma opção de compra na Amazon, Booking ou Wish, quando pesquisamos uma informação no Google ou Tripadvisor, onde está a vertente humana na operação? Ela reside, cada vez mais, na capacidade de criar, gerir e controlar os algoritmos que nos fazem chegar o produto, serviço ou informação pretendida.
Ao longo deste milénio, na busca incessante de mão de obra barata, os países ocidentais procuraram a Oriente as soluções que lhes permitiam construir margens de negócio elevadas, à escala global. É assim com a produção de roupa no Bangladesh ou Vietname ou com a gestão de Call Centers na Índia ou Filipinas. Nestes casos, o valor acrescentado para o mercado é dado, ora pela força das marcas (roupa, informática, automóvel, etc…), que não importa onde sejam produzidas, ora pela capacidade de resposta em tempo útil (no caso dos serviços bancários ou de telecomunicações).
Mas agora atravessamos um momento de viragem. Os milhões de empregos acima descritos que envolvem sobretudo tarefas básicas, podem estar em causa num curto prazo de tempo, como resultado da evolução da inteligência artificial.
Uma peça de vestuário produzida no Bangladesh, que depois é exportada para a Europa, pode vir a ser comprada através de um código da Amazon ou Wish e ser impressa em 3D, em Lisboa. Tudo isto até cada um de nós vier a ter uma impressora destas em casa.
Se por um lado o know-how, a criação de marcas e patentes ainda proliferam mais a Ocidente, contribuindo para que as grandes marcas mundiais consigam acentuar ainda mais a sua predominância no consumo de produtos e serviços, também não deixa de ser verdade que há uma grande aposta das economias orientais no desenvolvimento da Inteligência Artificial.
É o caso da chinesa Wesmart Shenzhen, que através da Inteligência Artificial, produz roupa que pode regular a temperatura, monitorar a respiração e orientar os atletas na monitorização do seu treino. Por outro lado, no sector automóvel, assistimos ao lançamento da startupByton–https://www.byton.com-, que estabeleceu umaparceria com a Baidu (Google chinesa), para desenvolver a inteligência artificial que alimentará a interfacedo condutor com o seu veículo, fazendo com que os passageiros possam controlar todas as operações no seu automóvel através de comandos de voz. E que dizer da startup SenseTime ,dedicada ao uso de inteligência artificial no reconhecimento de imagens, incluindo faces humanas que, apesar de desconhecida nos círculos de especialistas em tecnologia e segurança digital, acaba de ser avaliada em 4,5 mil milhões de dólares?
Tudo somado, as startups chinesas são hoje responsáveis por 50% de todo o investimento mundial neste domínio.
Ora, se a contribuição humana precisa de se centrar em actividades diferenciadoras e que saibam centrar o seu foco na relação, a guerra pela liderança da Inteligência Artificial não conhece barreiras.
Duas décadas depois de Kasparov ser derrotado pela “máquina”, o Alphazero da Google derrotou o Stockfish 8, programa campeão mundial de xadrez em 2016.
A questão central é esta: o Stockfish 8 levou anos a aprender com a experiência humana secular dos jogadores de xadrez e criou algoritmos que lhe permitiram calcular 70 milhões de posições num segundo. Mas o Alphazero aprendeu sozinho com os algoritmos automáticos, isto é, jogou contra si próprio. Este inexperiente Alphazero jogou 100 vezes contra o Stockfish 8 e nunca perdeu. O mais curioso é que essa aprendizagem demorou 4 horas.
E é assim que estamos a iniciar o tempo em que a Inteligência Artificial combate a Inteligência Artificial. Em Silicon Valley ou em Zhongguancun. E quem sabe, por cá…..