Recentemente, foi muito comentado um discurso de um máximo responsável de um banco português, precisamente por quase nada se perceber do seu discurso, uma vez que o recurso a uma linguagem demasiado hermética e técnica, o tornou impercetível para a grande maioria dos seus recetores e público em geral. Propositado ou não, correto ou não, o certo é que a mensagem não passou.
No marketing não tem sido diferente! Nomes novos para termos antigos e anglicismos diversos são uma faceta constante do léxico de muitos diretores de marketing e das agências de comunicação. O autor destas linhas não escapa a essa realidade, sempre que se assegure previamente que essa é a melhor forma de se expressar.
A análise SWOT será sempre preferível à análise FOFA, da mesma forma que Break-Even é mais simpático que Ponto Morto das Vendas e Performance mais chic que Desempenho. Já Customer Centricity é uma designação pomposa para se afirmar o propósito da Orientação para o Cliente, no mesmo sentido em que Leads continuam a ser oportunidades de negócio, Sales Pipeline é um funil de vendas e Big Data representam dados estatísticos do mercado.
Mas vamos desmistificar a complexidade de um novo léxico que é uma resultante de uma nova realidade digital que emerge da tecnologia. Não são temas novos, mas carecem de um dicionário novo:
- Likes e emojis são expressões de satisfação;
- Personas não são outra coisa que Segmentos de mercado trabalhados com a devida minúcia, ao ponto de descrever com detalhe a atitude de compra e outro tipo de comportamentos do consumidor;
- CTR (Click Through Rate) não é mais do que a taxa de conversão que mede a eficácia na passagem de uma fase do processo de comunicação à fase seguinte.
A diferença é simples: nuns casos a interação é física, noutros é com o ecrã.
É o caso do modelo RACE (Reach, Act, Convert, Engage) que é em tudo semelhante ao muito antigo modelo AIDA (Atenção, Interesse, Desejo, Ação).
Se num caso, a comunicação capta a nossa atenção, nos leva ao ponto de venda, nos faz percorrer os lineares, colocar produtos no carrinho e pagar, no outro iremos à homepage, procuramos informação no catálogo de produtos, adicionamos o que pretendemos ao cesto de compras e fazemos check-out. Não compliquemos, pois!
Era uma vez um merceeiro que apontava por telefone ou recebia pessoalmente a lista de compras de um cliente do qual sabia o nome, geria as encomendas, domiciliava as mesmas, oferecia um mimo aos clientes mais fiéis, preocupando-se em saber se estava tudo conforme e com os quais aceitava manter uma conta corrente, que arredondava para baixo no final do mês.
Estávamos perante alguém que, sem o saber, atuava numa lógica de Customer Centricity, em Omnichannel, geria o CRM, conhecia o Small Data, tratava do Delivery, permitia ao cliente proceder ao Pick-up das compras e gerar Word of Mouth, enquanto aferia o NPS. É caso para dizer que sabia identificar as diferentes fases do Customer Journey e otimizava o Customer Experience.
Hoje, a tecnologia permitir-lhe-ia registar encomendas de forma automática, receber diretamente na conta através do MBWay e fomentar comunicação mobile com os seus clientes. Se antes estava nas Páginas Amarelas, hoje teria um site e eventualmente uma app.
A evolução da tecnologia serve os clientes, otimiza a logística, facilita a interação, dinamiza a comunicação e permite medir o impacto em resultados de forma quase imediata. Mas de que vale um Check-in Online, QRCode e um Fast Track para apanhar um avião se este parte invariavelmente atrasado uma hora? A tecnologia e os algoritmos devem acrescentar valor à oferta básica e quando o fazem geram impactos positivos na rentabilidade e competitividade.
Por vezes, parece querer criar-se a ideia de que tudo o que é complexo tem mais valor. É precisamente o contrário. Já ficou para trás o tempo em que era preciso complicar para demonstrar trabalho árduo.
Exige-se hoje a simplificação nos processos e na ligação entre marketing, vendas e pós-venda. Mas também na mensagem, que se pretende mais personalizada, menos intrusiva e mais eficaz. Afinal aquela que é capaz de gerar envolvimento.
É nesse envolvimento que encontramos as palavras que nunca mudam independentemente do contexto: gestão, qualidade, cliente e confiança.
Não deixa de ser curioso que em 2020, um dos cursos mais procurados nas escolas mais reputadas de gestão a nível mundial, intitula-se Knowing the Customer. O nosso merceeiro conhecia-os!
O difícil é tornar fácil!