São diversos os mitos que decorrem da estratégia de marketing e que são detetáveis em várias práticas. Comecemos pela visão e missão. Estas têm forçosamente de corresponder a ambições e práticas reais, que possam ser confirmadas no dia a dia pela forma de estar das organizações.
Mais do que encontrar a frase ideal que é digna das melhores citações, a visão representa o “barco” onde queremos que entrem todos os que nos envolvem e que serve de motivação ao seu sentido de pertença. Já a missão não é mais do que um conjunto de práticas permanentes que explicam como podemos lá chegar.
E o que dizer da análise SWOT? Presos a alguns quadrantes rígidos que explicam uma reflexão interna, associadas a um diagnóstico da envolvente, em que muitas vezes se força uma leitura enviesada das fraquezas em benefício dos pontos fortes, são múltiplos os casos em que esta não representa a realidade.
Ora, se uma estratégia é um caminho que emana de um diagnóstico e este representa um ponto de partida irreal, o que dizer do próprio caminho? Esta análise é muitas vezes ferida de dois problemas:
1) a de retratar apenas uma visão interna produzida entre quatro paredes repletas de post its, sem escutar a voz dos clientes;
2) a de ocultar as debilidades da própria gestão da empresa (em quantos planos estratégicos se identifica a falta de dinâmica ou visão estratégica aos líderes?).
A solução passará sempre por nos colocarmos na pele dos clientes, pelo que humildade e realismo devem ser as palavras fortes de qualquer diagnóstico.
Já quanto às vantagens competitivas, estas devem representar a razão óbvia, do ponto de vista dos clientes, para sermos identificados como uma boa opção de escolha. Todavia, quantas vezes lemos que a vantagem competitiva reside no facto de que “os nossos profissionais são os melhores” ou que “a nossa qualidade é superior à da concorrência”? O que é que isso quer dizer? Que os outros não prestam ou que são inferiores? E a que dimensão de qualidade nos estamos a referir? Prontidão, atendimento, fiabilidade, design, 24/7, garantias…..? A banalização do termo qualidade, torna-a uma explicação insuficiente, que não é validada por quem realmente conta: os clientes.
Na verdade, nem tudo tem de ser excelente para ter êxito. O restaurante da nossa eleição não tem se ser forçosamente o que tem a melhor comida ou aquele que presta um serviço de excelência. O restaurante preferido e que mais frequentamos pode perfeitamente ser aquele onde encontramos sempre um bom ambiente e onde revemos os nossos amigos. Por exemplo, as marcas de cerveja perceberam isso há muito tempo: mais do que ser mais leve ou mais loura, o importante é ganhar o espaço físico onde a marca circula. Entender a comunidade e as “tribos” que se formam à volta de um determinado ambiente é uma leitura muito inteligente para a afirmação de uma marca. Mais foco nos clientes e menos no produto.
O que se torna verdadeiramente relevante é ser capaz de alimentar um conceito distinto, ou até único. E ser vivido e percebido como tal. Afinal, o primeiro tablet veio ao mundo dez anos antes do ipad, mas na altura ninguém deu conta. As vantagens competitivas só existem se os clientes as virem, sentirem e, por isso, as preferirem. Na medida em que estão dispostos a pagar pela proposta de valor e a recomendá-la. Se encontramos uma ou duas vantagens estamos no bom caminho. Se encontramos 10 ou 20, estamos a falar com o espelho.
Finalmente, uma breve nota sobre os objetivos e as métricas. Estas devem influenciar a alteração de comportamento dos envolvidos. Quando um vendedor ouve que “temos que aumentar as vendas em 20%” quando sabe que, muito dificilmente, chegará a metade, desliga do objetivo cinco segundos depois.
Há uma ciência e um saber por detrás de qualquer estratégia. A estratégia de marketing não é uma tese, tal como um plano de ação não é um conjunto de coisas giras. Ambos devem ser ferramentas de trabalho. Não de opinião, mas de trabalho!